A Loteria e Outros Contos, de Shirley Jackson
Eu sou uma grande fã da Shirley Jackson. Pra mim, ela está entre os maiores escritores de todos os tempos. Uma das minhas favoritas, sem dúvida. Já tagarelei sem parar sobre ela aqui no blog e resenhei todos os livros que saíram dela no Brasil (e até um que nem saiu ainda). Tem uma tag bem recheada de textos sobre a Shirlinha aqui no blog (é só acessar clicando aqui).
O que eu mais gosto das histórias da Shirley Jackson é o absurdo. Tudo causa uma estranheza, tem algo de esquisito mesmo. Suas histórias de horror são de um horror tão mundano. A gente dificilmente vê fantasmas e castelos e correntes e possessões e essas coisas todas. Mas há a paranoia, há a desconfiança, há a traição — todos os tipos de traição, nem sempre entre relacionamentos.
O último que li da Shirley foi A Loteria e Outros Contos, lançado aqui no Brasil no final do ano passado pela Alfaguara, com tradução de Débora Landsberg. Quando ele foi publicado é claro que eu corri para comprar o meu exemplar. Ele estava nos meus planos de leitura de dezembro, mas depois do calhamaço de A Dança da Morte (que eu já escrevi aqui), eu acabei enrolando e só consegui terminá-lo agora em janeiro.
Assim como outras histórias da autora, os contos apresentados neste livro vão fazer o leitor, por vezes, perguntar "eita, mas acabou?". E isso é muito engraçado. Algumas pessoas odeiam esse tipo de conto, eu adoro. A Mariana Enriquez é uma das que faz muito isso, e se não me engano a Samanta Schweblin também (preciso reler os contos da Samanta, inclusive).
Enfim, é desse absurdo que eu gosto. É desconfortável. Te deixa em um lugar de "meu deus o que tá acontecendo", e às vezes não te entrega nada mais que isso.
Para mim, o que a Shirley Jackson escreve é o pesadelo de toda pessoa introvertida. Tem um conto nesse livro aqui que é o retrato da maior angústia da pessoa introvertida, que é o conto "Como Mamãe Fazia", que se tornou um dos meus favoritos e quando terminei de ler quase me deu palpitação, onde uma mulher praticamente se apodera da vida de seu vizinho. Eu pensei, incrédula "não acredito que isso está acontecendo aqui". E estava mesmo.
O conto "A Renegada" é outro que merece destaque e me deixou completamente biruta das ideias. Uma mulher, da vida, se muda para o subúrbio querendo paz, quando sua cachorra mata algumas galinhas de seu vizinho, e todos passam a dizer que vão ter que sacrificar a pobre cachorrinha. Por pouco eu não terminei esse conto às lágrimas. Pra mim, esse é outro poder da Shirley: você constantemente se engasga com o que ela escreve.
Outros que destaco como meus favoritos são "Charles", sobre um garotinho que conta aos pais as travessuras de um colega da escola e, bom, reviravoltas que prefiro não comentar; "Jardim Florido", sobre uma mulher que acompanha com atenção os passos da nova vizinha e passa a tratá-la mal quando ela contrata um homem negro para seus trabalhos no jardim (outro conto que me deixou até enfraquecida com a garganta seca); "Elizabeth", que a Tali Grass até citou na sua newsletter (e que eu os convido a assinar clicando aqui), que é sobre uma jovem que, bom, tem grandes sonhos (rsrs); e "Estátua de Sal", que assim como o "Como Mamãe Fazia" é uma homenagem especial aos pesadelos dos introvertidos.
Eu me vi muito em "Estátua de Sal". No conto, um casal do interior vai passar uns dias em Nova York. No começo tudo parece ótimo, mas conforme os dias vão avançando a esposa começa a ficar desconfortável com a cidade grande, seu ritmo, até ficar completamente aterrorizada. Minhas últimas semanas em São Paulo foram parecidas. Eu me sentia mal constantemente em ter que sair. Mesmo agora, morando no interior, tenho meus receios. Em breve devo visitar São Paulo de novo, em pleno carnaval, e já estou assustada de pensar.
Eu devo ter alguns outros favoritos entre os contos, mas esqueci de marcar, como geralmente faço. Esses, entretanto, em uma olhada rápida, foram os que mais gostei.
Eu comentei no meu goodreads que não gostei tanto dessa seleção de contos como gostei, por exemplo, de Dark Tales, que tem uma pegada muito mais sombria. Mas, ainda assim, é um baita livro, com contos de tirar o fôlego, daquele jeitinho que a Shirley Jackson consegue fazer.
Sigo torcendo para que a Alfaguara traga outros livros da grande Rainha do Horror em breve. A Shirley tem uma escrita surpreendente. Sempre que alguém me diz que decidiu ler Shirley Jackson por minha causa eu me sinto instantaneamente mais feliz.
A Loteria e Outros Contos, de Shirley Jackson, pode ser comprado na Amazon*, em formato digital ou físico.
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*Comprando com meus links da Amazon, você dá aquela forcinha sem pagar nada a mais por isso :)
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