[Crônicas Vampirescas] A História do Ladrão de Corpos, de Anne Rice
Cheguei, finalmente, ao quarto livro das Crônicas Vampirescas. Tem sido uma jornada e tanto. Caso vocês queiram ler sobre os outros livros, vou deixar os links a seguir: Entrevista com o Vampiro, O Vampiro Lestat e A Rainha dos Condenados.
Demorei muito mais que geralmente demoro para ler um livro lendo A História do Ladrão de Corpos (em uma edição de 2009, da Editora Rocco, com tradução de Aulyde Soares Rodrigues). Não sei o que aconteceu. Na verdade, sei um pouco: o Lestat estava me irritando. Acho que nunca vi alguém cometer tanta estupidez em tão poucas páginas. Por várias vezes eu quase perdi a paciência e coloquei fogo no livro. Sinto que, a cada livro das Crônicas, eu perco um pouco da minha sanidade. É uma espiral de loucura que eu não esperava — e, pelo que vi nos próximos livros, a tendência é piorar. Mas seguirei firme nessa missão.
A História do Ladrão de Corpos começa algum tempo depois do final de A Rainha dos Condenados. A colônia de férias para vampiros que Armand criou em sua ilha não durou muito tempo. Na verdade, pelo que conta Lestat, durou pouquíssimo. Mas era de se esperar: ninguém parece gostar muito de ninguém nesse grupo.
Nos encontramos com um Lestat muito mais deprimido que antes, com sonhos e visões recorrentes de Cláudia, um estado de espírito complexo e uma enorme vontade de morrer. Lestat tem se alimentado de assassinos e homens cruéis, mas a gota d'água, para ele, ocorre com a necessidade de se alimentar de uma idosa que ele encontra certo dia. Então, depois de visitar David Talbot (o agente da Talamasca que faz uma participação rápida em A Rainha dos Condenados e A Hora das Bruxas), Lestat decide que sua hora chegou. Ao ir até o deserto para tentar finalmente acabar com sua vida, ele descobre que, apesar da luz do sol o deixar bastante machucado, não é tão simples assim dar cabo da força de um vampiro — ainda mais um vampiro que tem o sangue de vampiros tão antigos como Akasha.
Depois que sua experiência no deserto não deu certo, ele se reencontra com David, se recupera da exposição ao sol, tem uma longa conversa sobre a juventude de seu amigo, batem um longo papo sobre o que seria Deus e o Demônio (e isso aqui vai ser bastante importante mais adiante nas Crônicas), e Lestat volta a viajar por aí.
No início do livro Lestat teve um encontro com um homem que, de acordo com ele, parecia bastante estranho. Neste primeiro encontro, o homem lhe entrega um conto de Lovecraft. Da segunda vez, envia um conto de Robert Bloch para Lestat em seu quarto de hotel. Lestat logo percebe que esse homem sabe sobre ele e, também, não demora muito para juntar os pontos dos temas que ambos os contos (e outras entregas, como um filme, também) têm em comum: todos são sobre trocas de corpos. Lestat se encontrou com um feiticeiro capaz de trocar de corpos com outras pessoas.
David, graças aos arquivos da Talamasca, faz uma busca completa e logo descobre bastante sobre o homem. Chamado Raglan James, ele mesmo já foi da Talamasca. Conhecido por ser um ladrão de marca maior (não só de corpos, mas de muitos bens físicos), Raglan quer fazer a troca com Lestat. Suas condições são alguns poucos dias e, por uma soma em dinheiro (10 milhões de dólares), promete devolver o corpo de Lestat.
Se você está se perguntando se Lestat seria imbecil o suficiente para cair em uma presepada dessas, é porque você conhece pouco o Lestat. E ao longo do livro fica bastante claro que, sinceramente, pouco tem a ver com o fato dele querer ser humano novamente. Na verdade, ele queria saber se poderia ser feito.
E pode. Mas Raglan não cumpre seu prometido, e temos aí cerca de um terço do livro com Lestat tentando recuperar seu corpo. De início, Lestar procura a ajuda de Louis, que se nega a ajudá-lo. Marius, que o observa de longe, também se nega. David Talbot, então, parte em seu auxílio.
O livro tem pontos realmente muito interessantes. Por exemplo, sempre nos apegamos nas mudanças físicas que ocorrem nos corpos de um humano transformado em vampiro. As descrições da própria Rice sobre as mudanças que são descritas nos dois primeiros livros das Crônicas deixam bastante claro que a coisa é horrenda. Mas poucos se apegam aos detalhes sentimentais e mentais. Rice, mesmo que sutilmente, explora esses detalhes nos questionamentos de Lestat: a forma como ele vê David, como ele enxerga o mundo, como ele pensa, como ele vê a si mesmo. É uma transformação bastante interessante.
"Sou o ideal da minha espécie. Sou o vampiro perfeito. Está olhando para o Vampiro Lestat quando olha para mim. Ninguém pode ser melhor do que esta figura que está na sua frente, ninguém! Não sou um brinquedo do tempo, nem um deus empedernido pelos milênios, não sou o bufão com o gorro negro, nem o nômade contrito. Eu tenho consciência. Sei distinguir o certo do errado. Sei o que faço e, sim, sou o vampiro Lestat. Aí está a sua resposta. Faça o que quiser com ela."
Lestat também ganha a companhia de um cão, chamado Mojo. Provavelmente era o cão de estimação do dono do corpo que Raglan se apossou, Lestat passa a cuidar dele ao longo do livro e, imagino, adiante também.
Mas o livro também tem alguns pontos negativos. Pra começar, ele é um pouco arrastado. Muitas descrições (que são normais nos textos de Rice) se tornam um pouco repetitivas. E, claro, a burrice de Lestat, que age ignorando as consequências de TODOS os seus atos, e depois fica ressentido consigo mesmo. Uma alma atormentada que acha que a melhor coisa a se fazer com isso é atormentar outras pessoas também — e depois se afogar em autocomiseração. Não sei se tenho paciência para essa mentalidade de 10 anos em um corpinho de 300 do Lestat. Se vocês se lembram bem, eu disse na última resenha que só gostava dele a cada livro que se passava. Pois bem, hoje tudo mudou novamente.
Outras duas coisas me chamaram atenção no livro. Antes de comentá-las, queria dizer que achei muito engraçado quando avisei que iria começar O Ladrão de Corpos e logo algumas pessoas vieram me dizer: tem coisas que acontecem no livro que quero muito saber sua reação, quando você chegar nelas vai saber quais são. Realmente, logo soube dessas duas situações: Lestat força sexo com uma moça assim que se torna mortal e há algumas passagens sobre David Talbot e sua relação com o Candomblé. A primeira situação, claro, achei de péssimo gosto. Dado o contexto do acontecimento pode até ser condizente com o personagem, ao mesmo tempo que eu preferia que tivesse sido mantido de fora do livro. A segunda questão eu não sei como opinar. Sou ignorante sobre o Candomblé, e é um assunto que eu gostaria de conhecer melhor para poder opinar, apesar de ter quase certeza que as descrições de Rice sobre a religião não batem exatamente com a realidade.
Até certo ponto eu entendo porque a Rice colocou a religião na história. Levando em consideração que Rice cresceu na Louisiana e diversas religiões de matriz africana, caribenha e afins são uma parte intrínseca da cultura local até hoje, e ela até insere algumas dessas religiões ao longo das Crônicas e das histórias das Bruxas Mayfair, imagino que ela queria colocar, também, outras religiões de matriz semelhante. PORÉM, e é um porém enorme aqui, eu acho de péssimo gosto o olhar exótico para essas religiões. E a Anne Rice acrescenta um olhar exótico na maioria dos temas que ela se dispõe a tratar, pelo menos nessa primeira parte das Crônicas. Não rebaixo de forma alguma o que Rice construiu com sua literatura, mas a crítica precisa ser feita, e o olhar exótico age muito mais como desinformação do que como fonte de admiração.
Mas, enfim, livro lido depois de tantos dias e tantos momentos de raiva. Dentre os quatro livros até agora, esse está longe de ser meu favorito. A ordem de preferência seria: A Rainha dos Condenados, O Vampiro Lestat, Ladrão de Corpos e Entrevista com o Vampiro. Vamos ver o que Memnoch nos reserva.
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