A Casa das Sete Torres, de Nathaniel Hawthorne

by - junho 02, 2021


Tive uma conexão imediata com Nathaniel Hawthorne quando li A Letra Escarlate, ano passado. Foi algo repentino e não imaginei que fosse tão forte, mas quanto mais os dias se passaram mais eu pensava no Hawthorne e como eu queria ler tudo e qualquer coisa que ele tivesse escrito. 

Em A Letra Escarlate, temos Hester Prynne, durante o período puritano em Massachusetts, uma mulher que foi condenada, após humilhação em praça pública, a andar com uma letra A em vermelho em suas vestes para que todos conhecessem o pecado que cometeu, o de ser adúltera. A história de Hester é triste e trágica, seu destino aos poucos sofre uma melhora. Todos os personagens desenvolvem seus papéis e tudo faz com que a narrativa seja fluida e inquietante.

Nós sabemos da injustiça cometida por Hester Prynne. Independente do que fez, seu castigo foi muito superior ao que deveria ser aceito. Além disso, sua própria alma boa deveria ser uma forma de remediar a questão. É só muito ao longo do romance que as pessoas começam a perceber que Hester é uma mulher generosa e tranquila, sobrevivendo como pode e ajudando os menos abastados que ela. 

Foi uma leitura surpreendente que permaneceu comigo durante todos esses dias, desde que a terminei ano passado. Nesse meio tempo li um ou outro conto de Hawthorne, como "A Filha de Rappaccini", enviado aos apoiadores da Sociedade das Relíquias Literárias, um clube de assinatura de contos online da Editora Wish.


Até que chegou o momento que eu decidi que precisava ler A Casa das Sete Torres. Desde que li Hawthorne pela primeira vez eu tive certeza que esse seria O livro dele para mim. Eu não estava enganada. Escolhi lê-lo em uma edição antiga, de 1983, do antigo Círculo do Livro, com tradução de Lígia Autran Rodrigues Pereira. Não costumo ligar tanto pra qual edição eu leio de um livro, desde que ela esteja bem feita, mas achei que para esse livro aqui eu precisava de uma edição antiga, pra manter o clima.

O livro nos conta a história de um homem que, acusado de bruxaria por todos, acabou perdendo o terreno onde morava para um puritano rico e muito famoso do local. A questão é que tudo não passou de uma tramóia para o pobre homem perder seu pedacinho de terra, pois o puritano, o primeiro da família Pyncheon, queria aquele local para ele por haver ali uma fonte de águas muito boa. A questão é que, ao morrer, o homem, chamado Matthew Maule, jogou uma maldição no Coronel Pyncheon, afirmando que "Deus há de fazê-lo beber sangue".

"O velho Matthew Maule, numa palavra, foi executado pelo crime de feitiçaria, sendo um dos mártires desse terrível erro que nos deveria ensinar, além de outras moralidades, que as classes influentes, e os que se arrogam o direito de dirigir o povo, são inteiramente responsáveis por todas as faltas que sempre caracterizaram os mais estúpidos motins. Sacerdotes, juízes, políticos, as mais sábias, mais calmas e mais santas pessoas dessa época eram justamente os que mais se aproximavam do cadafalso, para mais alto aplaudir a matança, e os últimos a se confessar errados."

Pyncheon constrói a imensa casa de sete torres, no que viria a ser a Pyncheon Street, e segue sua vida. Certo dia, prestes a receber o governador, o Coronal é encontrado morto em seu escritório, como se aquela maldição houvesse finalmente ser cumprida.

200 anos se passaram para a família Pyncheon e muita coisa aconteceu dentro daquelas paredes da casa das sete torres. Personagens vieram e foram embora e não sabemos muito deles, até restarem somente cinco: Juiz Pyncheon e seu filho (que é somente comentado ao longo do livro), Clifford, Hepzibah, e a jovem Phoebe. Outros Pyncheons existem espalhados pelo mundo, provavelmente, mas esses quatro (com exceção do filho do juiz), são os mais importantes. Os Maule, entretanto, desapareceram. Um quinto elemento importante para a história é Holgrave, um daguerreotipista que mora na torre norte da casa.


Hepzibah vive sozinha na casa das sete torres. Uma mulher velha que, por causa da miopia e sem enxergar muito bem, sempre parece estar fazendo careta — fazendo com que poucos sintam piedade da pobre senhora. Juiz Pyncheon, um homem de posses e muita fortuna, vive em sua casa de campo. Clifford, irmão de Hepzibah, se encontra preso por um crime do passado. De acordo com a história, Clifford teria assassinado seu tio — tio também de Hepzibah e do Juiz Pyncheon) — após um ataque de cólera. 

A chegada da jovem Phoebe, filha de um primo que morava mais ao interior da Nova Inglaterra, dá novos ares ao local. Ela passa a cuidar do jardim, passa a ajudar Hepzibah que resolveu abrir uma loja para se manter — visto que não aceita ajuda do juiz —, e tudo vai bem. Mas há algo que espreita a casa das sete torres. O local guarda muitos segredos, muitos desejos de vingança, muita amargura e muito horror. 

Não é um livro de surpresas. Nós vamos acompanhando o mover das peças, como num quebra-cabeças, já sabendo mais ou menos qual imagem se formará no final. É um livro de sensações e de jornada. E o ponto mais gostoso de toda a leitura é o narrador. Narrado em terceira pessoa, nós temos um narrador irônico, que satiriza e utiliza do sarcasmo sempre que possível para demonstrar injustiças cometidas contra seus personagens, ou escolhas terríveis feitas por eles. É a narrativa a cereja do bolo dessa história familiar de desgraças e tragédias e pouca felicidade. 

Nesses dois trabalhos longos de Hawthorne temos questões sensíveis sobre determinadas injustiças sociais. Descendente de John Hathorne, um dos juízes responsáveis pelos julgamentos por bruxaria de Salem, Hawthorne alterou seu sobrenome com um w para se distanciar desse parentesco, ao qual sempre foi muito crítico. Em A Casa das Sete Torres, além de criticar os próprios julgamentos de feitiçaria, Hawthorne também critica uma antiga aristocracia presa em antigos costumes e a falta de ação para adentrar o futuro, além da moralidade absurda de uma pureza dos dois homens Pyncheon que, por fora eram ótimas pessoas, mas estavam podres por dentro há muito tempo.

A Casa das Sete Torres, assim como "A Filha de Rappaccini", junto de "O Experimento de Heidigger" foram adaptados para o cinema com o nome de Nos Domínios do Terror (Twice-Told Tales) com direção de Sidney Salkow e protagonizado por Vincent Price, o que é só mais um motivo para que eu tenha esse afeto pelo Nathaniel Hawthorne.


Assim como a maioria das adaptações que Vincent Price participou, como as do Ciclo do Poe de Roger Corman, as histórias foram transformadas quando passadas aos filmes. A mais próxima, talvez, seja "A Filha de Rappaccini". No segmento de A Casa das Sete Torres, porém, a história foi amplamente alterada e poucos elementos tem a ver com o livro original de Hawthorne.

Independente disso, é um filme incrível, como todos os filmes protagonizados por Vincent Price.


Como já comentei algumas vezes, fico muito feliz quando meus gostos se conectam. Então, assistir a esse filme foi um momento de diversão e de alegria para mim que, além de estar nesse momento fascinada pelo trabalho de Hawthorne, também sou eternamente apaixonada por Vincent Price.

Compre os livros:

  • A Casa das Sete Torres: Amazon (edição da Nova Fronteira, diferente da usada no texto)
  • A Letra Escarlate: Amazon
Lembrando que, comprando com meus links da Amazon, você dá aquela forcinha sem pagar nada a mais por isso :)

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1 comentários

  1. Assim como vc, eu também me apaixonei pelo estilo de escrita de Hawthorne ao ler "A letra escarlate". Agora estou lendo "A casa das sete torres".

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