Revistos: Garota Sombria Caminha Pela Noite, de Ana Lily Amirpour
Rever um filme que vimos há muitos anos e do qual nossa memória pouco se lembra é sempre uma aventuras. As chances de amarmos ou odiarmos uma obra da qual anteriormente a gente até gostava (ou desgostava), são enormes. É por isso que alguns preferem se manter na memória afetiva, não revisitando seus clássicos favoritos.
Essas mudanças de gosto se dão muito pelos momentos em que vivemos. Às vezes, um filme que amávamos há dez ou cinco anos já não conversa com quem somos hoje. E o contrário também acontece. Em casos de obras de outros países, ou outras décadas, um pouco do costume também transparece nesses gostos: às vezes, depois de um tempo, estamos mais acostumados com ritmos diferentes, com narrativas diferentes.
Revi Garota Sombria Caminha Pela Noite, de Ana Lily Amirpour, esse final de semana. O filme foi lançado em 2014, em Sundance, e fez sua estreia mundial em 2015 (em dezembro de 2015, no Brasil). Extremamente elogiado, com uma importância enorme, eu diria que Garota Sombria (...), ao lado de Raw e The Babadook, foi uma trindade extremamente importante para os olhares se voltarem às "novas" diretoras da década de 2010.
Pode procurar. Nas listas e recomendações daquele período (e na década que se segue), Garota Sombria sempre aparece ao lado desses dois outros filmes como obras importantes para conhecermos os novos títulos dirigidos por mulheres, ou mulheres que têm explorado a direção no cinema, etc.
Nascida inglesa, Amirpour se mudou para os Estados Unidos na década de 1980. Garota Sombria foi seu debut com longas e recebeu diversos prêmios pelos festivais em que passou, além de ser um sucesso da crítica, ficando conhecido como o primeiro longa iraniano de vampiros. Para a sua produção, Amirpour contou com financiamento coletivo.
O filme acompanha a história de um jovem, Arash (Arash Marandi), que é ameaçado por um traficante, após seu pai, viciado em heroína, ficar sem pagar o que deve. Pouco depois o traficante se encontra com A Garota (Sheila Vand), nossa vampira, que o convence a levá-la para casa. Lá, ela acaba matando o homem. O jovem então encontra o homem morto, pega seu carro de volta e leva consigo dinheiro e drogas. O encontro de Arash com A Garota é um dos pontos marcantes do filme, e ambos criam uma ligação fácil entre eles, que os segue até o final.
A primeira vez que assisti ao filme, apesar de achar fascinante todos os detalhes, e sempre recomendá-lo quando pude, ele não entrou para os meus favoritos. Não era um filme que me dava vontade de revisitar, que eu queria rever intensamente. Tanto é que até então eu não tinha revisto. Esses dias conversando com a Michelle cheguei a comentar com ela, que geralmente eu divido os filmes em: veria todos os dias (ou o que eu chamo de filmes que deixo passando para fazer a unha), filmes que não veria de novo de jeito nenhum (que são filmes que sinceramente, não), filmes que dificilmente eu veria de novo se não fosse obrigada (que são filmes que eu posso ter gostado, mas têm assuntos difíceis), e os filmes que só não me dão muito interesse de rever. Garota Sombria, até então, estava nesse último.
Mas, devido a um acaso do destino, revi o filme esse final de semana. Ele melhorou muito nessa revisitação. Já achei mais pontos positivos, me diverti mais, prestei mais atenção às cenas, e gostei muito mais do que vi. Gosto da personagem da Garota, gosto muito das descobertas que Arash faz, apesar de me sentir um bocado triste por ele, gosto muito dos cenários e da forma como o filme foi filmado.
Ana Lily não se preocupa em dar uma história de fundo ou de origem para a Garota, ela simplesmente existe nas ruas daquela cidade abandonada. E a forma como ela caminha (pela noite, é) entre os humanos, decidindo a quem se mostrar e quando se mostrar, são escolhas interessantes. Não são todos que a veem. Só suas vítimas, Arash, um garoto que vive pela rua, e Atti, uma prostituta que se envolveu com o traficante morto e com o pai de Arash. Gosto dessas escolhas, gosto desse grupo cheio de problemas que se reúne ao redor da Garota.
Mas o ritmo continua me incomodando um pouco. É um filme lento, não é muito meu tipo de filme, mas acho que cabe muito aquela coisa que disse no começo: o costume também atrapalha muito.
Quando estamos muito acostumados com um tipo de filme, que tem uma mesma escolha narrativa ou que segue um mesmo caminho, a gente acaba ficando preso naquilo. Comentamos sobre isso no episódio do TWH de A Mulher que Põe a Pomba no Ar, filme brasileiro da década de 1970, dirigido por Rosângela Maldonado e pelo Mojica. Não é, absolutamente, um filme que eu tenha lá muita vontade de rever, mas é engraçado como ficamos acostumados com um tipo de filme e logo que saímos um pouco daquilo já achamos estranho. E eu sou uma pessoa muito aberta a histórias contadas de forma diferente — pelo menos no caso de livros; talvez eu precise treinar um pouco mais nos filmes, e acho que estou pronta a visitar (e revisitar) outras histórias.
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