Semente Originária, de Octavia E. Butler
Começar o ano com um livro da Octavia Butler, eu acho, é começar o ano com o pé direito. É simplesmente uma escolha extremamente acertada. Recebi em dezembro o lançamento da autora no Brasil, Semente Originária (com tradução de Heci Regina Candiani), editado pela Morro Branco, e guardei ele até o primeiro dia de janeiro de 2022, mesmo estando muito curiosa.
O livro é o primeiro (de acordo com a cronologia da história, não da cronologia do lançamento) da série O Padronista. Nele, conhecemos dois seres antigos que, ao se encontrarem, entrelaçam sua história e estão prestes a mudar o mundo.
Anyanwu vivia tranquilamente em uma aldeia na floresta africana, no século XVII. Naquela altura, ela já tinha cerca de 300 anos de vida. Doro, um homem imortal, está vagando pela região quando sente uma energia diferente, algo que ele vem procurando e que chama de "semente originária", ou seja: os primeiros de uma geração poderosa. Ele vai até ela, a seduz, a leva consigo para o "novo mundo", e a apresenta a novas pessoas, novos costumes, novas situações.
Anyanwu é uma metamorfa. Assim que entra em contato com outros corpos, ela pode se transformar neles. E pode também escanear seu próprio corpo e descobrir se há algo de errado com ela. Doro, por sua vez, é um tipo de espírito, que passa de corpo em corpo utilizando-os como recipientes, fazendo com que cada um seja sua casa por um breve período.
Doro é um homem ardiloso. Sua intenção na terra, desde que morreu quando era muito jovem (há mais de três milênios), é formar um grupo de pessoas que se aproximem a ele em poder, mantendo todos sob controle, para que lhe sirvam como for melhor. Ele faz casamentos, uniões e acasalamentos entre pessoas em que sente poderes e faz com que essas crianças cresçam em segurança, até que elas mesmas possam gerar outros filhos, e esses filhos outros filhos, até que sua prole seja tão vasta e (quase) tão poderosa quanto ele mesmo, para que possam servi-lo como ele achar que devem.
O que Doro não esperava era que Anyanwu é uma mulher extremamente poderosa e que não gosta de abaixar a cabeça para ninguém. De início, ela até cede aos caprichos e mandos de Doro, mas se cansa de perder filho após filho, amigo atrás de amigo, sempre estando com medo do que Doro poderia fazer a ela.
É nesse clima de ódio e um certo tipo de entendimento entre os dois (afinal, eles são os únicos que sobreviveram tanto tempo), que Octavia Butler nos conta uma história cheia de detalhes incríveis. O relacionamento de Doro e Anyanwu é complexo, bem como ambos os personagens. Tecnicamente Doro é o vilão da história, e muito do que ele faz é baixo, cruel e violento; mas Doro tem muitas camadas. Assim como todas as escolhas de Anyanwu. Não importa tanto quem é bom ou quem é mau. As fronteiras entre os dois se entrelaçam constantemente.
O ritmo da história é fluido e faz com que você fique ansioso pelo final. O que vai acontecer a Doro? Será que Anyanwu se verá livre dele em algum momento? O que Doro busca, exatamente? Quais as experiências que ele está fazendo? Terão resultados? E se nascer algum descendente mais forte que ele? Além disso, Semente Originária é, assim como os outros livros de Butler, também, uma constante fonte de questionamentos: sobre colonização, sobre o tratamento racial, sobre o período em questão (séculos XVII, XVIII e XIX), e sobre os pensamentos que ficaram da época.
Foi uma leitura maravilhosa. Acompanhar os dois personagens em seus vários momentos de alegria, tristeza e dor foi uma jornada e tanto. A construção da história é interessante, os personagens, os dons de cada um (mesmo os que não são protagonistas, já que Doro reuniu boa parte de pessoas com dons), e até o final eu fiquei encantada com as escolhas, as possibilidades, a complexidade de cada um deles. Terminei de ler muito feliz por ter escolhido essa como a primeira leitura do ano.
Estou ansiosa para os próximos volumes da série. Assim que terminei de ler, fui correndo pesquisar os próximos livros e suas sinopses. Lançada a partir dos anos 1970, terminando somente nos anos 2000, a série O Padronista conta com os livros, de acordo com a ordem de lançamento: Patternmaster (1976), Mind of My Mind (1977), Survivor (1978), Wild Seed (que é o Semente Originária, de 1980), Clay's Ark (1984) e Seed to Harvest (2007). Entretanto, a ordem de acontecimentos e leitura que melhor se aplica à série é: Semente Originária, Mind of My Mind, Clay's Ark, Survivor e Patternmaster. Imagino que a Morro Branco deva seguir essa linha de publicação. Mesmo sendo uma série, o livro se encerra bem como volume único. A ansiedade para ler os próximos vem somente dos personagens e de saber que realmente existem outros livros.
Assim como todos os livros da Octavia Butler, recomendo fortemente a leitura. Tomara que os próximos não demorem tanto. A Morro Branco tem feito um trabalho muito especial publicando as obras da Octavia por aqui (e torço para que continuem. estou aguardando muito por Fledgling).
* O livro foi recebido como cortesia da Editora Morro Branco
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Lembrando que, comprando com meus links da Amazon, você dá aquela forcinha sem pagar nada a mais por isso :)
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