A Saga Crepúsculo

Crepúsculo, o filme que mais atraiu fãs e haters durante esses anos, está completando 10 anos de sua data de estreia. O filme foi lançado em 2008, baseado no livro de mesmo nome de Stephenie Meyer, e rendeu uma franquia de qualidade duvidosa, mas que atraía uma quantidade considerável de jovens.
É necessário dizer que Crepúsculo não entra na categoria filmes de terror, mas achei importante escrever um texto sobre a série de filmes, visto que 1) é uma franquia de grande sucesso que trouxe os vampiros de volta aos holofotes (vocês podem aceitar ou não, mas trouxe); 2) meu foco principal de pesquisa são, ainda, vampiros, mesmo que eu trabalhe com o terror de forma geral.
Obs: Esse texto se atém aos filmes da franquia, e não aos livros. Li os três primeiros e era muito nova, não vou conseguir fazer um paralelo decente.
Começo dizendo que esse texto tinha outro propósito quando comecei a maratona dos filmes da Saga: eu queria listar 99 motivos pelos quais a Saga pode ser considerada ruim, e um desses motivos não seriam seus vampiros. Mas não consegui e listei somente 33. Transformei, então, o propósito: Crepúsculo é um filme péssimo sobre relacionamentos abusivos e tóxicos, mas ele não é esse horror todo que todo mundo diz, e eu pretendo me explicar a seguir.
Primeiro preciso explicar o motivo que os vampiros criados por Meyer não são um problema.
Durante o passar desses anos muito foi dito sobre esses vampiros. O fato de que eles brilhavam no Sol parecia ser um ultraje muito grande aos grandes fãs de vampiros da década de 1990/2000 (em grande parte jogadores de Vampiro a Máscara, que, querendo ou não, foi um grande colaborador para a manutenção de status dos vampiros como seres das trevas super ultra mega poderosos), e isso gerou uma enxurrada de comentários homofóbicos e absurdos. Sim, porque os vampiros que brilhavam não poderiam ser homens de verdade - e o que uma coisa tem a ver com a outra até hoje eu não entendi.
Mas, e fazendo o único paralelo com os livros que posso me lembrar, a autora menciona que suas peles eram parecidas com mármore branco. Muito natural que eles brilhassem no Sol, não é? Mas isso incomodou demais os grandes entendedores de vampiros. "Um vampiro sair NO SOL? Isso é um absurdo!", se esquecendo completamente que estamos lidando com um ser mitológico antigo, e acreditar que ele não passou por nenhuma transformação ao longo desses muitos anos é o verdadeiro absurdo. O vampiro de 1818 é bastante diferente do vampiro de 2008. É compreensível essa vontade de se prender à bestialidade e à violência desses seres, mas não são em todas as histórias que eles são assim, e esse é, sem dúvida, o menor dos problemas da série.

O maior problema da série são seus relacionamentos.
Se você não faz ideia do que se trata Crepúsculo, eu posso resumir para você: Bella Swan (Kristen Stewart) chega em uma cidade nova, se apaixona pelo garoto popular mas ele parece meio estranho. Até aí tudo bem. Mas ele é um vampiro. E até aí tudo bem. Mas Edward (Robert Pattinson) e Bella começam um relacionamento de dependência e controle de um sobre o outro e a partir daí já não tá mais tudo bem.
Mas vamos por filmes.
Twilight (2008)
Dirigido por Catherine Hardwicke.Edward ser um vampiro não seria um problema muito grande, se ele não utilizasse seus "poderes" da forma mais absurda do mundo: observando Bella dormindo da janela do quarto dela, ou até mesmo dentro do quarto, sem que ela soubesse ou permitisse. Além disso, o primeiro contato real que ambos tem é quando Edward demonstra sua força em público e salva Bella de um carro desgovernado - o que pode ser uma metáfora sobre o relacionamento desses dois, infelizmente. Durante metade do primeiro filme temos um relacionamento meio de gato e rato: os dois tem uma atração, mas se retraem, até que finalmente decidem ficar juntos.
Bella é apresentada à família de Edward e até arruma uma encrenca das grandes com um grupo de vampiros que estava de passagem pela pacata cidadezinha de Forks, o que causa a morte de um deles. A parceira desse vampiro, Victoria, jura vingança e será um problema nos próximos filmes (não um problema muito grande, porque foi um personagem muito mal utilizado durante todo o seu arco). Não podemos nos esquecer de um personagem importante que aparece já nesse filme: Jacob, rapaz que mora numa comunidade indígena de Forks, e se torna rapidamente amigo de Bella (os dois se conheciam desde crianças) e desenvolve um tipo de paixão irrefreável por ela.
O maior problema desse primeiro filme é seu ritmo lento, que poderia ser resolvido com meia hora a menos, e todo esse começo de relacionamento que já começa de forma bem errada.

New Moon (2009)
Dirigido por Chris Weitz.Se Twilight é um filme problemático, New Moon é o triplo. Depois de colocar a vida de Bella em risco, Edward decide ir embora. Bella, porém, descobre que consegue ver Edward quando está em momentos de perigo e começa a fazer tentativas desesperadas: anda de moto em velocidade alta, bate a cabeça numa pedra, salta de um penhasco, entre outros momentos absurdos que você não acredita serem possíveis. Nesse filme Bella se aproxima de Jacob, o que piora a paixão dele, e acaba mostrando como ele é um problema tão grande quanto Edward: quando o vampiro liga para Bella para saber se ela estava bem, pois Alice, sua irmã que tem visões do futuro, a vê morta após pular do penhasco, Jacob diz a Edward que Charlie, pai de Bella, estava em um funeral, levando ele a crer que Bella havia mesmo morrido e ido até o Conselho dos vampiros para morrer também.
Quando eu disse anteriormente que era um relacionamento de dependência tóxico, em partes era disso que eu falava: Edward acreditava que deveria morrer sem Bella e Bella não queria viver sem Edward. Isso pode até vender para adolescentes, mas é perigosíssimo. No fim, Edward volta para Bella, firmam compromisso, e promete transformá-la em vampira.
New Moon é, sem dúvida, o pior filme da série. Todas as tentativas de Bella de ver Edward através de momentos perigosos, Jacob com o sentimento de possessividade dele (que piora nos outros filmes mas nesse é nojento), toda a angústia e tristeza de uma garota de 16/17 anos por um namorado não deveria ser tão pesada assim. A discussão de Jacob com Edward no final desse filme sobre Bella é uma coisa ridícula.

Eclipse (2010)
Dirigido por David Slade.A Saga poderia ter começado em Eclipe que não faria muita diferença, e seria até melhor. Edward prometeu ao Conselho dos vampiros que transformaria Bella, e foi combinado entre os dois que isso aconteceria depois da formatura do colégio, mas Edward impõe que Bella se case com ele. Bella é relutante sobre isso, tendo sofrido com a separação dos pais, não acreditando na instituição casamento. E isso poderia ser um ponto interessante de ser tratado no filme, mas logo é esquecido pois Jacob fica pior que um cão raivoso quando descobre essa situação toda. Tudo fica pior quando Edward entra no jogo de Jacob e tenta proibir Bella de ver o amigo.
Nessa altura já sabemos que Jacob faz parte do grupo de lobisomens da cidade, e que os Cullen convivem com os lobisomens Quileutes de forma pacífica, mas cada um dentro da sua porção de terra. Descobrimos também uma coisa que os lobisomens tem, chamado imprinting: consiste no fato de que, quando você é um lobisomem e conhece uma pessoa e tem um imprinting com ela, é pior que se apaixonar, pois você perde completamente o controle sobre si e precisa proteger a pessoa. Eu não sei de quem foi essa ideia, mas vampiros brilharem é bem menos pior do que lobisomens terem imprinting. Jacob não teve um imprinting em Bella, mas tem um sentimento de possessividade irracional e animalesco, dizendo que preferia a ver morta do que como vampira, forçando nela um sentimento que ela afirma não sentir.
Nesse filme temos uma cena interessante entre Edward e Jacob, que mudou de postura afirmando saber que não era bom o bastante para ela, dizendo que não forçaria ela nunca mais a nada, enquanto Jacob permanece com uma postura arrogante de "eu sei que sou melhor que você e a Bella vai descobrir isso também", o que dá uma preguiça enorme.
Considero Eclipse melhor que New Moon exatamente por essa mudança de atitude de Edward. Edward teme pela vida de Bella, tem medo de transformá-la em vampira, mas passa de estúpido para alguém que dialoga, enquanto Jacob só piora enquanto personagem e enquanto suposto amigo de Bella. Parece que a Meyer e os produtores do filme desconhecem a amizade entre um homem e uma mulher, com Jacob forçando que Bella sente algo por ele, fazendo chantagem emocional, dizendo que preferia morrer.

Breaking Dawn Part. 1 (2011)
Dirigido por Bill Condon.Edward e Bella finalmente se casam. Edward, por ser "muito forte", acaba deixando Bella roxa na noite de núpcias e se nega a se deitar com ela novamente (o que gerou outra enxurrada de comentários grotescos sobre a sexualidade de Edward, sendo que o problema é outro aqui). Porém, Bella está grávida! O filme é inteiro sobre a gravidez de Bella e o que está crescendo dentro dela, sem que ninguém soubesse que isso poderia ser possível. O problema é que a criança é meio humana e meio vampira, o que acaba com as forças de Bella, a tornando cadavérica. Tudo isso parece bem absurdo, não é?
Pois piora: Edward quer que Bella tire o bebê que a está matando, e Bella não quer tirar porque é seu bebê. Descobrem, por fim, que Bella precisa beber sangue pra se recuperar, já que o bebê pede esse alimento. Edward, por fim, se apega à criança e volta a dar apoio para Bella, após assumir que era um idiota. Os lobisomens, após descobrirem que Bella carregava algo perigoso dentro de si, entram em luta contra os Cullen, até que: Jacon descobre que teve um imprinting com a bebê (!!!!!). Pelas regras dos lobisomens, então, não poderiam fazer mal à criança.
Tenho pra mim que essa é uma das escolhas mais problemáticas da série: mesmo que esse imprinting seja no sentido de proteção, além de ser um recém nascido, ainda é uma forma de colaborar com a ideia de que as pessoas estão destinadas às outras de alguma forma. Isso é horrível. MAS, esse filme tem, sim, uma cena muito bem feita e assustadora: o parto de Bella é, no mínimo, medonho. Todo o desespero, o sangue, as tentativas desesperadas de Edward de transformá-la em vampira antes de morrer, tudo isso faz ser uma cena bem aterrorizante.

Breaking Dawn Part. 2 (2012)
Dirigido também por Bill Condon.Bella já é uma vampira, Edward, ela e Renesmee (considerado um péssimo nome por todos), já estão morando em sua casinha e acham que tudo está bem, apesar do crescimento acelerado da criança. Porém, os Volturi, o conselho dos vampiros, descobre que um meio humano, meio vampiro, nasceu. Descobrimos nesse filme que o poder de Bella como vampira é ser um tipo de escudo, fazendo com que ela liberasse um tipo de energia que serve como barreira contra os ataques dos outros vampiros.
Isso soa um pouco problemático, mas nessa altura eu acho que problema já não é uma preocupação da equipe dessa Saga. O que poderia ser a grande salvação desse filme, que é uma luta muito interessante dos Cullen, aliados com os lobisomens, contra os Volturi, acaba se mostrando somente uma visão da Alice, e isso me tirou do sério. A luta é realmente uma cena boa, Edward e Bella coexistem de uma forma "normal", Jacob não está sendo um babaca, poderia muito ser um filme interessante de verdade, mas utiliza o recurso mais preguiçoso do cinema: foi um sonho/visão.

Recentemente, em comemoração aos 10 anos da série, o The Guardian publicou uma matéria dizendo como Bella mudou o papel feminino em Hollywood a partir de 2008, e como sua determinação durante a Saga é uma importante amostra de poder feminino. Por um angulo, até posso concordar. Ao final de Eclipse, o terceiro filme, Bella faz um discurso interessante sobre se sentir deslocada, de escolher o caminho de se tornar vampira porque ela acreditava ser melhor para ela, não somente por Edward - e se isso foi uma tentativa desesperada de Meyer para fazer as coisas se encaixarem e dar um ponto a mais de coragem para Bella, quem sou eu para discutir.
Em Breaking Dawn Part 1, o quarto filme, vemos uma Bella lutando para dar a luz à sua filha, mesmo que todos digam que ela vá morrer no processo. Apesar de todo o relacionamento tóxico entre os três personagens principais, Bella, de alguma forma, pode até ser considerada uma personagem interessante. Mas, sem dúvida nenhuma, merecia ter tido escolhas de roteiro mais decentes e que fossem condizentes com essa personalidade.
Por fim, a perseguição à Kristen Stewart é completamente sem sentido. Muitos criticaram sua atuação como Bella, mas é preciso dizer Stewart fez de Bella um retrato de uma adolescente solitária e cuja apatia condiz muito com o que sente em relação ao seu lugar no mundo, como Bella afirma se sentir no final de Eclipse.

4 comentários
Toda a saga me incomoda muito pelo puritanismo e pelo relacionamento tóxico de Bella e Edward ser visto como algo ~romântico~. O fato de ela ter que se casar com ele sem nem ter 20 anos e ele observando a Bella dormir foi demais pra minha cabeça, além de um vampiro masoquista, de 117 anos, que adora sofrer no ensino médio. Será que não tinha nada pra eles fazerem esse tempo todo, minha gente??
ResponderExcluirA parte de sofrer no Ensino Médio eu acho que é de uma bizarrice sem tamanho hahahah quem gostaria de repetir o EM pra sempre? credo.
ExcluirNo livro Eclipse, tem muito sinais de possessividade e obsessão tanto pelo Edward quanto pelo Jacob que até a beija a força, ridículo. Essa saga todinha é toxica e muita gente romantizando.
ResponderExcluirAté agora eclipse é o livro que eu mais gostei. O Edward sempre dando a opção de escolha para a Bella mesmo que isso machuque ele. Sobre o Jacob... acho ele completamente desnecessário, um personagem que realmente me causou nojo, forçando e manipulando a Bella. E confesso que não sei se entendi se a Bella ama o Jacob ou não. Enfim, estou gostando mais dos livros do que dos filmes, todos eles tem muito mais diálogos e tem muita coisa interessante que ficou fora dos livros.
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